Por ser o dolo elemento inerente à conduta descrita no tipo penal, não há que se alegar a ausência na infração de causar poluição ambiental, tornando área urbana ou rural imprópria à ocupação humana, se o delito decorrer do lançamento de resíduos sólidos, líquidos ou gasosos, ou detritos, óleos ou substâncias oleosas, em desacordo com leis ou regulamentos.
Com esta fundamentação, por unanimidade, a 2ª Câmara Criminal do TJ (Tribunal de Justiça da Bahia) recebeu denúncia do MP (Ministério Público) contra o prefeito do município de Aramari, Fidel Carlos Souza Dantas (PP), por suposta infração ao crime descrito no artigo 54, parágrafo 2º, incisos I e V, da Lei nº 9.605/1998.
Com cerca de 11,5 mil habitantes, Aramari fica no agreste baiano a 120 quilômetros de Salvador. Segundo o MP, há anos o município mantém em seu território um depósito irregular de lixo, que provoca poluição ambiental, especialmente pelo lançamento de detritos. Tal prática tornou imprópria para a ocupação humana, pelos riscos à saúde, uma área semiurbana de cerca de 1.500 m².
Narra a denúncia que o prefeito, desde o seu primeiro mandato (2017-2020), é “conivente” com a administração do “lixão” e despreza as tentativas para o ajustamento de conduta com o MP, deixando de adotar conscientemente as medidas para sanear as irregularidades, “quer ao meio ambiente, quer à população em estado de vulnerabilidade social“.
Reeleito e no exercício do segundo mandato, que vai até 2024, Fidel teve a ação por crime ambiental ajuizada contra si em abril de 2021. Na resposta à acusação, os advogados requereram a absolvição sumária sob a alegação de que o lixão existe há mais de 40 anos, não podendo o denunciado ser responsabilizado por ele. A defesa do prefeito também argumentou não haver dolo e prova de materialidade delitiva.
“Não há que se falar em ausência de dolo porque se trata de elemento inerente à conduta descrita no tipo penal em questão“, observou a desembargadora Ivete Caldas Silva Freitas Muniz. Relatora da ação penal, a julgadora também afastou a tese de falta de prova material, porque laudo pericial apontou que o lixo coletado pela Prefeitura é depositado, sem tratamento, diretamente no solo da área citada na denúncia.
De acordo com a perícia, o local do descarte fica a 400 metros de um poço de captação de água para consumo humano, sendo constatada a existência de danos ambientais com potencial risco de contaminação às pessoas que trabalham no lixão e àquelas que consomem águas subterrâneas das proximidades. O laudo também apontou riscos à fauna, sendo necessária análise mais aprofundada quanto a possível dano à flora.
“O delito imputado na denúncia se relaciona a infração ambiental causadora, em tese, de dano de âmbito local, no município de Aramari, sendo as correspondentes atribuições de prevenção e saneamento, como é de conhecimento geral, de responsabilidade do prefeito, contexto que permite concluir pelo aperfeiçoamento da legitimidade passiva”, acrescentou a relatora. Segundo ela, a denúncia preencheu as exigências dos artigos 41 e 395 do Código de Processo Penal.
O colegiado ressalvou não se verificar nos autos evidência da necessidade de se afastar cautelarmente Fidel do exercício do mandato. O próprio MP não formulou pedido nesse sentido. Na hipótese de recebimento da denúncia, o artigo 2º, inciso II do Decreto-lei 201/1967, que dispõe sobre a responsabilidade de prefeitos e vereadores, determina a manifestação fundamentada do juízo quanto ao afastamento ou não do réu do cargo.
Fonte: Conjur